Cultura & Arte

No Sony Center, escultura sugere uma Berlim plural e tolerante

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Foto: GBS Berlin

Não muito longe do Portão de Brandemburgo, seguindo a trajetória do Muro de Berlim para o sul (para isso procure na calçada do Tiergarten, logo em frente ao Monumento aos Judeus Assassinados na Segunda Guerra), você vai dar de cara com a moderna Potsdamer Platz, onde se encontra o famoso Sony Center. Todo este complexo futurístico está cercado de restaurantes (vou fazer um review de um por aqui chamado Lutter & Wegner), salas de cinema, do Museu de Cinema, um shopping center chamado Arkaden e outro, enorme, chamado Mall of Berlin e outras atrações. Alguns metros adiante, a partir da Potsdamer Strasse (a rua Potsdam), está o Fórum de Cultura, local da Filarmônica e de dois ótimos museus, a Gemälde Galerie (pinturas clássicas) e a Neue National Galerie (arte contemporânea), que está, no momento, fechada. Uff… Dá pra notar que se trata de um espaço imperdível na cidade…

Pois bem, meu interesse aqui não é falar de nenhum destes lugares mencionados, nem mesmo do Sony Center. O que me inspirou hoje foi falar de uma bela escultura de bronze que se encontra na entrada da estação de metrô da Potsdamer Platz (haverá uns pedaços de muro em frente à estação) e que tem muito a ver com a história recente de Berlim. Na verdade, estou me referindo ao Monumento a Giordano Bruno. Para quem não sabe, Bruno foi um grande pensador do século XVI. No ano de 1600 ele foi queimado pela Inquisição depois de ter vivido sete anos no cárcere. Neste período, a Igreja pregava que o homem era um ser privilegiado no Universo e que a Terra era seu centro. Giordano Bruno colocou em questão esta visão e afirmava que o Universo era infinito e que existia uma pluralidade de mundos.

Obra original de Polzin encontra-se em Nola, na Itália

A obra de arte que embeleza o andar subterrâneo do belo prédio da DB (a empresa de transportes alemã) é uma cópia de bronze de 6m de altura. A escultura original é de madeira e encontra-se em Nola, cidade-natal do pensador italiano. Ambas foram concebidas pelo berlinense Alexander Polzin. Ao contemplar a obra de Polzin, o que chama a atenção é o fato de que Giordano Bruno está de ponta-cabeça e que, apesar de sua estrutura de bronze, seu corpo parece ser de madeira.

Não podemos nos esquecer que a Santa Inquisição não somente perseguia e queimava pensadores, mas também judeus. É neste ponto, evidentemente, que os alemães em geral, os berlinenses em particular, entram nessa história. Nazistas também queimavam judeus. Transformam pessoas em coisas (lembrem-se que a pele de judeus viravam pele de abajur…), daí Bruno parecer ser de madeira. E mais: os nazistas apregoavam uma visão de mundo limitada, preconceituosa, desrespeitadora da pluralidade. Não há como ignorar algumas semelhanças entre o tribunal católico do século XVI e o triste período em que Hitler esteve no poder na Alemanha.

Pensar que nesta mesma Potsdamer Platz, nos anos 20, a belle époque berlinense estava no seu apogeu. Artistas do mundo todo viam como obrigatório passar por Berlim.

A bela e "hi-tech" Potsdamer Platz (Fonte: Bestourism)
A bela e “hi-tech” Potsdamer Platz (Fonte: Bestourism)

É o período, por exemplo, do nascimento do cinema expressionista e das manifestações da arte moderna alemã. Enfim, por todos os lados, assim como hoje, Berlim mostrava uma vocação pelo diferente, pela liberdade.

Nada mais genial do que prestar homenagem a um homem tão importante do passado no presente. Nada mais genial perceber que o Giordano Bruno da escultura está de ponta-cabeça e, portanto, vendo o mundo sob uma outra perspectiva que não é a nossa.

O fato é que os alemães fazem questão de deixar claro que o passado nazista foi enterrado. Obras como a de Polzin têm esta função e eu posso dizer: ela consegue ser bastante precisa em sua linguagem. Talvez seja possível afirmar que essa escultura resume o que é a Berlim pós-queda do muro. Sem dúvida uma cidade que não só nos faz desejar que nossas cidades (de origem ou onde moramos) sejam também assim, mas que as mentes que as habitam também sejam assim, ou seja, plurais e defensoras da liberdade e da democracia.

Berlim é incrível!

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