Caminhar pela Unter den Linden, a rua histórica mais famosa de Berlim, pode ser um grande aprendizado para os que amam arquitetura. Nela não se encontram restos medievais da cidade, isso não. E para falar a verdade, mesmo os edifícios a serem vistos não são, com exceção do Museu Antigo, na Ilha dos Museus, construções originais. Basta assistir ao vídeo que já postei aqui para concluir que Berlim, sobretudo nesta bela rua, foi bastante castigada por bombas em 1945. Portanto, o que se vê são cópias fieis dos prédios que existiam antes da II Guerra Mundial. Há construções barrocas, como o Arsenal, atual Museu Histórico da Alemanha, ou a antiga Biblioteca Prussiana (agora Faculdade de Direito da Universidade de Humboldt), e neoclássicas, como a Ópera do Estado ou a Nova Guarda, obra do magistral arquiteto Karl Friedrich Schinkel. Caminhando em direção ao Portão de Brandemburgo, começam a aparecer prédios do período de ocupação soviética. Em suma, a Unter den Linden é uma grande colcha de retalhos em termos histórico-arquitetônicos.
O mais interessante é quando um artista, como o arquiteto sino-americano Ieoh Ming Pei, logra combinar em uma de suas construções diferentes estilos e épocas. Pei é conhecido pela controversa pirâmide que embeleza o Museu do Louvre, em Paris. É dele também a Galeria Nacional, em Washington. Quando o assunto é Berlim, o arquiteto de origem chinesa tem seu nome associado ao Quartier 206 e também ao prédio complementar do Museu de História da Alemanha, o Pavilhão de Exibições. Neste último caso, ele esbanja genialidade.
Ieoh Ming Pei foi aluno de Walter Gropius e Marcel Breuer, dois grandes nomes da escola de Bauhaus. Suas obras tendem a assumir o pragmatismo inerente a este estilo arquitetônico. No entanto, o Pavilhão de Exibições do Museu Histórico parece ser uma exceção a esta tendência. Só de contemplar a escadaria que o embeleza já nos faz pensar: aqui não há nada de pragmático, as linhas retas dão lugar a curvas oblíquas!
Muita história está contada nesta escadaria. Suas linhas me fazem lembrar dos cenários do cinema expressionista alemão. Sua forma nos remete a um projeto do arquiteto russo Vladimir Tatlin, na verdade uma torre de 400m de altura que deveria ter sido construída como monumento à Terceira Internacional Comunista e que jamais saiu do papel.
É neste aspecto que Pei se mostra genial. Além de conectar (historicamente) seu prédio com o barroco Arsenal (construção de 1705!!) através de uma bela passagem subterrânea, o próprio edifício ainda agrega outros momentos importantes da história (da arte) alemã. Quer seja pelo Expressionismo, escola artística genuinamente alemã surgida no fim do século XIX e odiada por Adolf Hitler, quer seja pela citação ao monumento de Tatlin.
Pei não se interessa pelo socialismo real que governou a parte oriental da Alemanha entre os anos de 1949 e 1990. Sua homenagem é aos comunistas românticos alemães, gente como Rosa Luxemburgo ou Karl Liebknecht que, como Vladimir Tatlin, foram vítimas da perseguição implacável aos homens e mulheres que quiseram transformar o mundo a partir de ideais marxistas.
Se você estiver em Berlim, a Unter den Linden certamente estará em seu roteiro. Não deixe, portanto, de virar em uma de suas travessas, mais precisamente a Hinter dem Gießhaus, para se impressionar com a bela obra de Pei. E por que não se inteirar da História da Alemanha, visitando o Museu de História?